As criticas ao D. Quixote em 2005  

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“Com indubitável oportunidade, o Intervalo Grupo de Teatro decidiu celebrar os 400 anos da publicação de “D. Quixote” de Cervantes. Fê-lo de maneira pouco convencional, com um trabalho de cuidada e minuciosa elaboração, a cargo do director do Grupo, Armando Caldas, que conseguiu culminar com êxito a ardua tarefa de pôr em linguagem comum e dar estrutura teatral às leituras do texto cervantino, que anteriormente teria sido realizado por autores tão díspares como: António José da Silva, “O Judeu”, Orson Welles, Rafael Azcona e Mauricio Scaparro.
O resultado do trabalho deste colectivo sem dúvida terá uma longa vida em cena pois, num texto tão “extremamente literário” como é “D. Quixote”, o grupo foi capaz de saber e transmitir ao público as essências mais profundas da imortal novela, que guarda a vigência, mais que nunca dos valores necessários, para combater e melhorar este mundo povoado de “canalhas e malandrins” de vários modelos.”

Francisco J. Faraldo
Professor do Instituto Espanhol



“Deste “D. Quixote de la Mancha” de Cervantes, soube Armando Caldas retirar o essencial, o que ficou ao longo dos séculos no património cultural do mundo inteiro: a boa loucura da solidariedade activa, da defesa dos fracos contra a brutalidade dos fortes sem que previamente seja feita a contabilidade mesquinha dos riscos e eventuais proveitos. (...) Tudo isto está neste espectáculo numa quase prodigiosa síntese do tom de transposição simbólica e poética com notas de humor e de enternecimento, da adivinhável escassez de meios com uma perfeita eficácia. Surpreendentemente pelo menos para quem não acompanha a vida do “Intervalo” com suficiente proximidade, Miguel de Almeida surge como um excelente Quixote, tanto e de tal modo que esgotaria a nossa capacidade de assombro se não fosse imperioso guardá-la também para Hélder Anacleto, esse enorme actor que na figura de Sancho Pança tem mais um momento altíssimo da sua carreira que infelizmente poucos conhecerão, num desconhecimento que é mais um sinal de como este nosso entristecido país ignora os seus talentos. (...) Mas seria gravemente injusto não acentuar que todos os outros que trabalham para este espectáculo se situam à altura dele, que não é pequena. O tempo de duração deste “D. Quixote de La Mancha” envolve-nos na convergência das palavras com o jogo cénico, da luz com o comentário musical sempre admiravelmente escolhido.”
Correia da Fonseca
Crítico



“Talvez tenha visto ao longo da minha vida uma meia dúzia de versões teatrais de “D. QUIXOTE DE LA MANCHA” de Miguel de Cervantes; ao levarem-me a Linda-a-Velha, para ver a colagem de adaptações de Orson Welles, Azcona, Scaparro e António José da Silva, desta obra imortal, estava longe de pensar que me emocionaria tanto, de tal forma que no final, não sei se terá sido a carga lírica, a música excelente, a movimentação coreográfica, o ritmo da representação, fruto da encenação de Armando Caldas, inteligente, culta, sensível e rigorosa, ou simplesmente pela “verdade” da interpretação de todo o conjunto dos actores, sobretudo, pela pungente e sonhadora presença de Miguel de Almeida, como nos deu D. QUIXOTE, e o picaresco, homem do povo, simples, analfabeto, sagaz, mas assimilador das vicissitudes da vida, de Sancho, numa criação inesquecível e notável de Helder Anacleto.
A encenação e a interpretação fundiram-se em absoluto. Esta é a melhor forma de servir o teatro e os espectadores. Eu como espectador vos agradeço.”
Juan António Saura
Professor da Universidade de Salamanca



“Armando Caldas ao encenar para o Grupo Intervalo o D. Quixote de la Mancha não pode deixar de nos tocar.
Relembra assim com esta produção, o 4º centenário da publicação do genial romance de Miguel de Cervantes, que aqui adopta na versão que Orson Welles preparou. Mas adiciona-lhe um traço português, com algumas coisas da peça de António José da Silva, o Judeu e dos italianos Azcona e Scaparro, e insiste mais no seu valor simbólico de idealista obstinado, defensor dos fracos e oprimidos, do que na figura satirizada no romance de Cervantes por parecer um pouco lunático, preso a aventuras cavaleirescas que então (no início do século XVII) pareciam entrar no seu ocaso.
Esta vertente que o espectáculo elege para marcar o seu herói é bem cumprida no trabalho de Miguel de Almeida: não só nos traços do rosto e na sua composição figurativa, mas também no aspecto algo absorto e sofredor que adopta, enquanto Hélder Anacleto, carregando os traços do medroso e infeliz Sancho Pança, tem um trabalho muito expressivo de bonacheirona humanidade. O resto do elenco acompanha-os numa calorosa aventura cénica, como é o caso de Fernando Tavares Marques, como importante figura de referência moral (no Mensageiro), de Maria Forjaz, de voz bem timbrada, e de muitos outros que em conjunto nos trazem o universo cervantino. Os figurinos, concebidos por António Casimiro, conferem à cena uma interessante plasticidade, o picaresco de algumas cenas trazem-lhe movimento e vivacidade e, no seu conjunto, o espectáculo resulta numa curiosa incursão à fantasia quixotesca.
E fica-nos esta imagem de um idealista que os tempos tristes que vamos vivendo parecem exigir cada vez mais: pela abertura que faz ao sonho, pela vontade de abrir caminho a uma utopia de justiça. E essa nota de exigência moral traz-nos o Grupo Intervalo, dirigido por Armando Caldas, e que se apresenta agora no Auditório Lourdes Norberto, em Linda-a-Velha.”
Maria Helena Serôdio
Professora Universitária, Crítica, Directora da Revista “Sinais de Cena”

This entry was posted on 4 de março de 2006 at 3/04/2006 . You can follow any responses to this entry through the comments feed .

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